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Rap Cru: Os 10 Melhores Discos do Rap Gringo em 2019

Ronald Rios

20/12/2019 18h13

Olá, degenerados! Chegou o momento mais importante da música mundial: o troféu Rap Cru Awards. Foi com certeza um ano muito em rico em mixtapes, discos, EPs e tudo mais. Eu ouvi muita coisa e ainda sinto que faltou ouvido para mais uma dezena de álbuns. Mas o relógio está batendo e essa é a hora de revelar o CREME do rap internacional em 2019. Fique atento e consciente de que essa é uma lista pessoal de Ronald Rios, logo é praticamente como se fosse um fato escrito em pedra.

Vamos a isso!

10. The Weeklys Vol1 – KXNG Crooked

1/4 da finada – até segunda ordem – Slaughterhouse, o MC de Long Beach, California, lançou um som novo por semana ao longo de 2019. Foi muito rap. "Weeklys 1" é uma espécie de mixtape com os primeiros lançamentos do ano. Eu podia indicar a 2 ou 3, que também ouvi muito mas essa tem um sabor especial. É o começo de um projeto ousado – que acabou por ser bem sucedido -, então Crooked tinha que já largar na frente com pé de chumbo no pedal. Reacender samples famosos no Hip Hop, dando um sabor fresco a eles e fazendo justiça às canções que fizeram notáveis esses samples, não era um trabalho fácil. Tem que ser alguém com algumas horas de vôo para tirar essa onda. E Crooked tirou pelo ano inteiro.  Começando por "96s" onde ele FLIPA o sample de "Can I Live?", clássico de 96 do Jay-Z. Baita cara lírico, o cara tem barras para semanas. Para um ano inteiro, na real. Mixtape shit.

9. It Wasn't Even Close – Your Old Droog

Sombrio, sarcástico, fucking asshole. Your Old Droog te traz vibes de Nas – mas com um estilo ainda mais relaxado, como quem olha para o despertador e em vez de apertar "soneca", já tira a bateria. Flow muito agradável em cima de loops lo-fi, fortes no baixo. Droog ainda viria a lançar mais um disco no mesmo ano, "Transportation", outro êxito que dividiu os fãs numa dúvida muito boa: qual é o melhor? Eu sou mais fã do primeiro mas nada contra o segundo, tenho até amigos que são. Com um flow despreocupado mas uma caneta que amarra sílabas muito bem, em alguns momentos Droog lembra o MF Doom em Madvillainy – mas ele tem a benção do Vilão do Rap, que participa da faixa "RST". Discasso de ponta a ponta.

8. Revenge of the Dreamers 3 – Dreamville & J. Cole

Eu sou um cara desconfiado de discos de crew. Muitos sabores diferentes podem dar numa salada de leite condensado com linguiça – um sabor que provavelmente existe na Pizzaria Bate-Papo, e se não existir, estão perdendo dinheiro. Então eu não estava esperando muita coisa desse disco, exceto algumas faixas que desse para pegar e colocar numa playlist pessoal depois. Mas uau, J. Cole soube conduzir sua galera com muito cuidado e o resultado é como se fosse um grupo de rap original. Tem espaço para todo mundo brilhar, Bas, JID, Omen, EarthGang… e logicamente, Cole que está pelo disco todo e é o único a ter sua faixa solo, "MIDDLE CHILD", que traz um pouco daquele Cole levemente professoral – mas com excelente lírica para fazer você sentir ele, querendo ou não. Fora que J Cole conseguiu sair um pouco da casinha solitária em que ele vive ("PLATINUM WITH NO FEATURES!!!") e veio brincar com mais amigos, isso é importante de vez em quando. O disco é um belo truque que ele tirou da cartola como maestro mas o time todo tá de parabéns, feliz com os 3 pontos que a gente veio conquistar e agora é pensar no próximo jogo contra o Avaí.

7. WWCD (What Would Chine Gun Do) –  Griselda 

 

O ano foi indiscutivelmente da Griselda Records. Benny The Butcher, Conway the Machine e Westside Gunn atacaram com projetos solos, EPs, mixtapes, discos, e todos num nível altíssimo de qualidade. Eles esperaram o fim do ano para formar como um Megazord o grupo "Griselda" e vir com o disco "WWCD" para encerrar as operações de 2019 em grande estilo, tendo seu primeiro lançamento em uma gravadora maior, Shady Records/Interscope e com um contrato de gerenciamento da Roc Nation. Quando você tem Jay-Z e Eminem financiando o seu rap, você não precisa de singles quentes no rap. Apenas o boom bap rasgado olhando pro futuro. É o que eu mais gosto. Traz o espírito sujão dos anos 90 mas com sutilezas que apontam para frente. Detalhe: o disco não tem samples. Isso não é algo positivo ou negativo, apenas uma observação que dá para buscar aquela sonoridade com cara de velhice sem ter que se preocupar em buscar liberação  dos samples quando já tá tudo pronto – normalmente o padrão da indústria, o que atrasa lançamentos, mantém faixas foras de discos, encarece os custos e tudo mais. Créditos pela equipe de beatmakers assassina formada por Beat Butcha e Daringer.

6. May The Lord Watch – Little Brother

Seguinte, eu estava um pouco preocupado com essa volta do Little Brother sem 9Th Wonder. Todo mundo meio que estava. Aquele medo de faltar alguma coisa. A real é que não fez diferença, com todo respeito a um dos maiores produtores que há. Mas Phone e Big Pooh são tudo menos bobos. Eles juntaram um pequeno time de produtores (em especial quem mais trabalhou foi Khrysis e Zo!) que trouxeram seu próprio sabor, mas sabendo atender as necessidades da dupla de MCs, que se perderam seu principal beatmaker, são MCs bem melhores em 2019 do que há 14 anos atrás, em "The Ministrel Show". Acaba compensando. Phonte continua com seu senso de humor sutil que dá para perceber tanto nas letras como em alguns detalhes da produção – ele cuida de algumas faixas também -, vinhetas, etc. Não tem como você ir errado com esse disco. NÃO TEM.

5. One of The Best Yet – Gang Starr 

Ok, eu não achei que iria ouvir um disco do Gang Starr nunca mais. Eu não fazia ideia de que havia isso tudo de gravações do Guru antes de falecer. E principalmente, eu não podia imaginar a qualidade das rimas. Uma coisa comum no rap – 2Pac e Big podem falar melhor sobre – é produtores aproveitarem versos gravados em vida dos MCs, chamarem algum parça do cara – ou pior, alguém que ele nem conhecia… e vir com um produto que só agrada os fãs hardcore mesmo – quando isso. Mas não. Premier estava há anos sentado em cima de horas de rimas. Algumas coisas muito boas para serem canções inteiras, algumas tinham um verso – e ele tem a autonomia para chamar quem quiser, sendo 1/2 do Gang Starr, algo que garante a integridade do projeto – e algumas coisas serviam para recortar, colar, fazer uns scratches, uns refrões e o que mais a cabeça do Premier conseguisse criar. É lógico que uma ou outra referência pop do Guru pode estar razoavelmente datada mas não é como se ele fizesse namedropping de noticiário a cada barra; ele rima sobre coisas universais que funcionariam 20 anos atrás ou 20 anos daqui pra frente. Seu estilo é inconfundível, Premier tem muito bom gosto e é tudo que você precisa saber sobre um dos melhores discos do ano. O título não é nenhum exagero. Realmente um dos melhores até então. Sem palhaçada por aqui.

4. Hitler Wears Hermes 7 – Westside Gunn

 

"The New King of New York", Westside já vem avisando em "Broadway Joes". Eu sinceramente não sabia qual projeto do Gunn eu colocaria aqui. Eu fui com esse mas podia ter sido "Fly God…" facilmente. Gunn anunciou aposentadoria já pra 2021 e eu sinceramente entendo. Ele criou em 2019 em quantidade e qualidade o que rappers levam 7, 10 anos às vezes. Esse aí trabalhou. E deu trabalho para outros MCs. Projeto após projeto, trazendo o rap com mochila nas costas, abusado, uma voz única, e uma única preocupação: destruir em linhas. Sem cantoria, sem virada de beat, sem U2 nem Alicia Keys. Manter as coisas simples e focadas naquele rap de ouvir no ônibus fazendo translado de 1 hora pela cidade e depois ainda pegar o metrô pra chegar no trabalho. Rap de trabalhador.

3. Eve – Rapsody

Goddess MC. Essa é a braba. Muitas metáforas e trocadilhos inteligentes, um excelente ouvido para as batidas, pronunciação cuidadosa; Rapsody é uma das melhores rappers do mundo há alguns anos. Esse disco veio só para constatar o óbvio mais uma vez. Ela tem 99 problemas mas rimar não é um deles. Ela faz todos os seus reclames com linhas criativas, mantendo você entretido e alerta o tempo todo. Você fica ouvindo e falando "realmente, o mundo tá todo cagado" mas através das melhores alegorias e passagens visuais que ela consegue criar com palavras. Muito talento, muita cabeça. Reverência completa.

2. Statue of Limitations – Smoke DZA e Benny The Butcher

Seis faixas, EP, eu não ligo. Tamanho não é documento, foi o que eu ouvi a vida inteira de pessoas prestes a me bater – e depois de me bater também.

Mas sério, não tem como excluir esse projeto só por causa do tamanho – especialmente depois que virou moda lançar disco de 7 músicas. Você tem Smoke DZA em excelente forma como de costume. Benny mostrando mais uma vez que os caras de Buffalo não estão aqui para brincadeira, Grisela é real. Pete Rock na produção de todas as faixas. Bagulho rueiro mesmo, thug life, vida loka até umas horas. Para ouvir caminhando de jaco no Centro no meio da madrugada. Eu ouvi – e ouço – esse trampo no repeat desde que saiu. Poucas coisas me chamaram atenção tanto quanto isso. É um daqueles discos que eu sei que vou voltar a vida toda. E toda vez que eu ouço faixas como Smoked and Butchered (com participação do Styles P), eu penso "meu Deus, o rap não podia voltar a ser sempre assim?" Eu sei, eu sou um guardinha. Viva ao trap, aproveitem jovens. Um dia vocês vão virar um velho amargo como eu. E às vezes vocês vão tropeçar num novo tipo de rap no futuro e vão relembrar com saudades dos bons tempos de Migos e Young Thug para reclamar: "Não dá pro rap voltar a ser assim?

  1. Bandana – Freddie Gibbs e Madlib, os MadGibbs

Madlib fez história já ao lado de vários MCs. E ele parece estar só começando. Usando uma sampleadora simples ou um iPad, ele é o cara que consegue puxar samples, recortes e tudo mais de um monte de lugar para criar algo novo, fresquíssimo e provavelmente com mais samples do que o encarte vem dizendo. Esse é lance dele. Encaixar um sample que você não sabe daonde veio. Parece até um jogo, um truque de mágica. E ele vem enganando à RIAA há tempos.

Freddie Gibbs é fuleiragem, treta, drogas – e muita rima. Humor distorcido pra cacete. Presença cabulosa. Constroi refrões bem herméticos. E lógico, tudo isso é estimulado pelos beats do Madlib. Depois de Piñata, o hype para Bandana era monstruoso. E ele entregou. Bandana bate mais forte ainda. Ele vai em vários lugares e usa sua voz para fazer um contraste à melodia, em vez de segui-la, criando uma sensação que bate antes de chegar o liricismo – que é de primeira linha. É meio óbvio esse disco estar em primeiro. Mas tem algum motivo, né?

É isso, galera. Em 2020 eu venho aqui ditar o que é melhor e digno de ouvir de novo. Lembrando que isso aqui é só minha opinião – e ela é invariavelmente um fato.

Sobre o autor

Ronald Rios é roteirista, comediante e documentarista. Apresentou o "Badalhoca MTV" de 2008 a 2011 na MTV Brasil. Na Band fazia o quadro "Documento da Semana" dentro do programa CQC, num formato de pequenos docs sobre pautas atuais na sociedade brasileira. Escreveu para o Yahoo, UOL, VICE, Estadão, Playboy, Red Bull e Billboard. Em 2016 fez a série de documentários "Histórias do Rap Nacional" para a TV Gazeta. Ronald também apresentou de 2010 a 2012 o programa "Oráculo" na Jovem Pan FM e foi roteirista do Multishow de 2009 a 2011, pela produtos 2 MLQS, onde rodou o programa de TV Brazilians, eleito um dos 5 melhores pilotos de TV nacionais de 2011 pelo Festival de Pitching de TV da operadora Oi. Em 2017 e 2018 rodou pequenos docs, podcasts e campanhas multimídia para o artista Emicida na gravadora Laboratório Fantasma.

Sobre o blog

Rap Cru é o blog do roteirista e documentarista Ronald Rios sobre Hip Hop. Brasileiro, americano, britânico, latino… o que tiver beats e rimas, DJs, grafiteiros e b-boys e b-girls, tem nossa presença lá.

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