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Não foi Eminem nem Logic que inventaram que "rap sucks" - e o povo concorda

Ronald Rios

15/05/2019 12h16

Os números chegaram! Logic e Eminem conseguiram faturar uma vaga na parada mais importante da música americana, o Hot 100 da "Billboard". Ambos ficaram em quinto lugar. É a segunda vez que Logic entra no top 10 da Billboard (a outra vez que isso rolou foi com o hit viral dele tratando de conscientização sobre suicídio, "1-800-273-8255", de 2017. Eminem já é menos estranho à parada, conseguindo com que a canção fosse sua vigésima primeira aparição na "Hot 100". Com esse número, Eminem empata com Jay-Z, como o terceiro rapper com mais aparições na parada americana. Ambos perdem entretanto para Drake e Lil Wayne, com mais aparições.

 

O que isso significa? Que o povo respondeu ao "rap de mochila". "Rap de verdade". Barras. Aos "old head". Aos "guardinhas" de rap. Chame como quiser, mas há pessoas que ainda querem ouvir um rap pelo simples fato de ser um rap bem feito, sem firulas feitas para agradar um público que não ouve rap. Esse esforço de agradar todo mundo que tornou o rap a música mais ouvida do mundo me faz perguntar: ouvida por quem? São as pessoas fieis à cultura ou um público que está a espera do próximo "Gangnam Style" pra sacudir a bunda bêbado na festa da firma – entre um hit e outro de autotune? "Homicide" caminha contrária ao rap pasteurizado que virou a música número 1 do mundo. Essa música mal tem refrão. O refrão é hermético e parece mais com os versos regulares dos MCs. É quase uma raridade dois artistas do mainstream se juntarem pruma tarefa assim – e uma raridade maior ainda a aclamação popular. O fato da música estar no top 5 da Billboard indica que ela rodou bastante as plataformas digitais – hoje em dia não se compra mais singles de 1 dólar  – e que há um mercado para um rap mais, digamos, cru.

No lançamento da faixa, como tudo que envolve o Eminem, a repercussão foi 50% positiva e 50% negativa. Certo, uma turma chapou nos versos que os dois MCs trouxeram dando aquela pisada de bota de couro de caubói no estado atual do rap; enquanto outra galera torceu a cara total pra esses dois rabugentos. Com que direito eles aparecem falando "fuck rap"? Por que esses supostos "MCs líricos" se acham com carta branca para pisar nos outros rappers que fazem parte da cultura?

Porque sempre foi assim, cara! Se gabar falando que você é o MC mais brabo e o resto é meia boca faz parte do rap competitivo. Lembra desse conceito? Todo CD o Jay-Z vinha rimando por que ele era o melhor e que o resto era trash? Nas? Lil Wayne? Kendrick em "Control"? Basicamente TODO MUNDO desde que a cultura começou e nem música se gravava ainda? Zoar o rap alheio das outras crews, dos "suckaz MCs", gente amada, onde foi que isso virou um problema? Tudo isso virou "inveja" hoje em dia? Que saco. Fuck rap, MESMO.

E sim, se dois MCs abençoados liricamente com um pouco mais de complexidade que a média do mainstream podem fazer uma parceria tirando um barato em cima do resto da cena, QUAL O PROBLEMA NISSO? Parece que a gente tá na geração que distribui amor pela mediocridade festiva e faz cara feia pro intelecto ácido. E isso é um mau sinal pro rap.

Duvida? Outro dia o Justin Bieber estava falando que "o Eminem não entende os rappers de hoje em dia". Sério? O Eminem não entende? Não precisa ir muito longe na discografia dele para ver que ele se dá muito bem com Kendrick, Cole, Logic, Royce, Joyner, sabe, uns cara que investe na caneta. A revolta do Eminem é de todo mundo que cresceu mimado com o melhor dos anos 90, uma época onde não tinha como o sujeito copiar nada. Flow, beat, referências e texturas. Tudo que tinha que ser original. Tinha que rimar para ser o maior rapper.

Mas se você quer ficar ao lado do Justin Bieber na discussão, fique a vontade.

Paz!
Ronald Rios, guardinha do rap.

 

PS- Esse post contou com um trecho da minha newsletter que saiu sexta passada. Você pode assiná-la nesse link aqui e receber um e-mail toda sexta sobre o melhor do rap nacional e internacional. As vezes o pior também porque nóis gosta de zoar com a cara alheia de leve.

Sobre o autor

Ronald Rios é roteirista, comediante e documentarista. Apresentou o "Badalhoca MTV" de 2008 a 2011 na MTV Brasil. Na Band fazia o quadro "Documento da Semana" dentro do programa CQC, num formato de pequenos docs sobre pautas atuais na sociedade brasileira. Escreveu para o Yahoo, UOL, VICE, Estadão, Playboy, Red Bull e Billboard. Em 2016 fez a série de documentários "Histórias do Rap Nacional" para a TV Gazeta. Ronald também apresentou de 2010 a 2012 o programa "Oráculo" na Jovem Pan FM e foi roteirista do Multishow de 2009 a 2011, pela produtos 2 MLQS, onde rodou o programa de TV Brazilians, eleito um dos 5 melhores pilotos de TV nacionais de 2011 pelo Festival de Pitching de TV da operadora Oi. Em 2017 e 2018 rodou pequenos docs, podcasts e campanhas multimídia para o artista Emicida na gravadora Laboratório Fantasma.

Sobre o blog

Rap Cru é o blog do roteirista e documentarista Ronald Rios sobre Hip Hop. Brasileiro, americano, britânico, latino… o que tiver beats e rimas, DJs, grafiteiros e b-boys e b-girls, tem nossa presença lá.

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