É preciso conhecer: Souto MC com vibrante single novo, "Ressurreição"
Ronald Rios
31/07/2019 08h57
Oi! Essa é a Souto MC:
Há muito tempo sou fã dela. Ela tem uma caneta incrível, agressiva, contundente. Extremamente inteligente e nunca deixa falha nos seus raps. Ela já é conhecida no meio underground mas é um daqueles talentos que você quer que chegue a mais pessoas, especialmente numa época onde groselha no mic gera tantos views e enche casas de shows pelo Brasil inteiro. Penso nela como uma MC da virada dos anos 90 pros 2000 – mas que chegou nessa época meio esquisita do rap, onde o gênero é o mais ouvido no mundo – mas inegavelmente diluído, palatável, mais fácil pruma audiência que foi se aproximar do rap agora. Uma audiência cuja última preocupação é a parte do rap. Desde que o refrão seja viciante, esteja falando de sentar na piroca e a batida contagiante e manjada; é o que vale. Ou então um cajon e um violão, aí lembra MPB, é chique. Por isso vemos uns valores invertidos. Rappers que em qualquer outra época iriam ser tidos como palha hoje reinam. Isso faz de Souto a contra-cultura. Barras, rimas, punchlines, esquemas de rimas internos, pronunciação, esmero em ter orgulho de ser lírica e destruir um beat. Ela não toma os atalhos às playlists das plataformas. Vai pelo caminho mais longo, com mais cabeças a cortar. Eu penso no corre da Souto como a luta da Uma Thurman contra os 88 Malucos em Kill Bill: a improvável vitória da guerreira. Na lugar da Hattori Hanzo, ela carrega o microfone. E ela vai estar viva na hora que sobrarem os verdadeiros.
Vou apresentar para vocês o último single dela, o ataque lírico "Ressureição", produzido Mayra Maldjian, sobre o qual conversamos recentemente:
Ronald: Eu adoro o single novo. É sobre você mas em algumas linhas a gente pega referências ao povo indígena. Fale um pouco desse significado tão íntimo pra você. Como é falar de si e ao mesmo tempo duma causa maior?
Souto: Pô, eu fico feliz que cê tenha gostado! Bom, é algo com qual tem que ser ter muito cuidado. A causa indígena e as pessoas indígenas tem questões muito profundas que precisam ser respeitadas e pensadas, antes de mais nada. Ao mesmo tempo que parece muito fácil falar sobre si, deixar a emoção de canetar algo tão importante e fundamental pra mim-me levar, eu confesso que eu penso muito no meu lugar e espaço sendo indígena urbana, tendo meus privilégios enquanto pessoa de pele mais clara; essas coisas tem que ser levada em conta. A fita é que é aquilo: a gente sabe o que nunca foi e o que sempre se forçou a ser, o momento agora é resgatar o que eu sou e o que foi tirado de mim.
Ronald: A estrutura da música é diferente também. Você vem com o que eu chamo de "clássico Souto", no estilo brabo, de batalha, desfere várias punch e guarda o refrão pro final só. Foi sua ideia ou da Mayra?
Souto: Nós pensamos nessa música muito juntas. Cada detalhe de beat, as frases que eu ia fazendo eu mostrava pra ela, perguntava o que ela achava e ela a mesma coisa. O som foi feito em 4 dias. A gente se conheceu, trocou ideia, referência, num dia ela me entregou o beat e no outro eu trouxe a letra. Eu confesso que eu fiquei em choque com o pouco tempo que tínhamos mas no final deu certo pra caramba. Tô feliz com a letra. E o refrão pro final foi unânime deixarmos no final pra bater como deve.
Ronald: É single solto, de EP ou de LP já?
Souto: É aquela entrada que tem nos restaurante chique antes do prato principal hahahahaha.
Ronald: Como tá o seu 2019? Mapeado? Quais os passos da Souto?
Souto: Mapeado e foco total no mapa. Esse ano vai ter disco SIM!
Ronald: O que eu mais admiro em você é a "brabeza" de batalha. Como você virou a MC que é?
Souto: Cê sabe que eu sempre frequentei batalha mas sempre tive muito receio de batalhar. Eu lembro que a atitude dos cara e das mina me deixava alucinada, porque memo apanhando, tomando varias, eles e elas tava lá brabão pronto pra responder. Acho que isso juntou com as carga e com a personalidade que eu tenho, ai deu nisso (rindo).
Ronald: Como planeja se destacar num mar de MCs que é o rap Brasil 2019? O que a Souto traz de diferente pra mesa?
Souto: Eu, sem falsa modéstia, escrevo muito bem. E naquelas entrevista de emprego ou qualquer outra, sempre que pediam pra eu colocar uma virtude minha eu escolhia autenticidade, saca? Hoje eu consigo me enxergar de uma forma diferente como artista e como mulher, me sinto mais orgulhosa… Algumas pessoas vão dizer arrogante mas essas mesmas pessoas não deram um tijolo pra ajudar a construir a auto estima e confiança que eu tenho hoje. Voltar eu não volto mais. O que eu trago de diferente é eu mesma, minhas letra, meu flow. Não é isso que se destaca hoje? Ser sincera?
Sobre o autor
Ronald Rios é roteirista, comediante e documentarista. Apresentou o "Badalhoca MTV" de 2008 a 2011 na MTV Brasil. Na Band fazia o quadro "Documento da Semana" dentro do programa CQC, num formato de pequenos docs sobre pautas atuais na sociedade brasileira. Escreveu para o Yahoo, UOL, VICE, Estadão, Playboy, Red Bull e Billboard. Em 2016 fez a série de documentários "Histórias do Rap Nacional" para a TV Gazeta. Ronald também apresentou de 2010 a 2012 o programa "Oráculo" na Jovem Pan FM e foi roteirista do Multishow de 2009 a 2011, pela produtos 2 MLQS, onde rodou o programa de TV Brazilians, eleito um dos 5 melhores pilotos de TV nacionais de 2011 pelo Festival de Pitching de TV da operadora Oi. Em 2017 e 2018 rodou pequenos docs, podcasts e campanhas multimídia para o artista Emicida na gravadora Laboratório Fantasma.
Sobre o blog
Rap Cru é o blog do roteirista e documentarista Ronald Rios sobre Hip Hop. Brasileiro, americano, britânico, latino… o que tiver beats e rimas, DJs, grafiteiros e b-boys e b-girls, tem nossa presença lá.