Topo

Histórico

Categorias

Descanse em paz, Proof do D12

Ronald Rios

07/10/2019 17h14

Texto anteriormente publicado na newsletter "Rap Cru". Assine-a em noticias.uol.com.br/newsletters:

2 de outubro é a data de aniversário do Big Proof, conhecido também como Dudey, DeShaun ou seu alterego no grupo D12, Derty Harry. Há 13 anos ele nos deixou por conta de uma briga idiota de boate que escalou para o uso de armas – elas são ótimas, não? Sim, vamos normalizar cada vez mais o uso delas, é uma grande ideia -, levando embora um dos nomes mais respeitados do rap de Detroit.

Sem Proof, não haveria Eminem. Eu repito: sem Proof, não haveria Eminem. Possivelmente então não veríamos o sopro de vida dado à Aftermath Records de Dr Dre em 99 com o Slim Shady LP, que reanimou a vida do Doutor que estava passando uma época complicada sem hits, sem peso. Dre não gozava de sucesso similar desde os tempos de Death Row, ao lado de Snoop Dogg, em 92/93; onde ele dominou o mundo pela segunda vez – a primeira tendo sido em 1988 com o NWA.

Proof e Eminem eram amigos de infância. Proof validou Eminem na cena de Detroit. Ninguém dava atenção pra um rapper branco – também pudera, o último a estourar havia sido Vanila Ice, então não dá para culpar a comunidade Hip Hop por não confiar tanto em MCs brancos. A fé de Proof em Eminem no Hip Hop Shop – pico underground de rap da cidade – foi o que ajudou ele a ter uma chance de rimar. A história é mais ou menos repetida no 8 Mile. Aquele amigo do Eminem era 100% inspirado no papel do Proof. Mais do que um parceiro com quem ele dividia técnicas parecidas de esquemas de rimar – rimas internas, frases inteiras rimando, a complexidade emprestada do Rakim -, Proof era o aval que Eminem teve para subir ao palco, ser ouvido e conquistar respeito.

Eminem estourou e não deixou o amigo para trás. Um ano depois de assinar com a Aftermarth, Eminem criou o próprio selo, Shady Records e lançou o CD Devil's Night do D12, grupo formado por Proof em mais formas do que se imagina. Eminem pode ter sido o superstar mas Proof era o líder, o general. Eminem fez de Proof seu hypeman nas suas performances solos, garantindo mais foco e grana para o amigo – e um show de mais qualidade uma vez que Em tinha ao lado o rapper no qual mais confiava para salvar sua vida no palco quando o oxigênio acabava. A energia de Proof no palco fazia parecer que os shows do Eminem eram na verdade de uma dupla. E de alguma forma, eles eram.

Proof era um professor no freestyle. O freestyle mais cru, aquele tirado da cabeça na hora da rima. Eu tenho horas de material no HD com Proof improvisando rimas. São várias sessões com Eminem em programas de rádio e a diferença entre os dois quando se trata de improvisar é abissal. Eminem é bom. Proof era uma besta. Você não conseguia acreditar na quantidade e qualidade das rimas que ele conseguia pensar ao mesmo passo que ia cuspindo versos no microfone. Quem viveu essa época de perto sabe que Proof era incontrolável. O próprio Eminem apelava as vezes, para não ficar muito para trás do amigo, cuspindo versos memorizados enquanto Proof criava no momento. Essa é a hora que os fãs do Eminem jogam pedras em mim mas o próprio Eminem confirmaria isso se lesse o que eu escrevo.

Ainda assim, viver à sombra do Eminem não era o bastante para um MC competitivo, o que levou Proof a lançar Searching For Jerry Garcia em 2005, um fantástico álbum onde a gente podia conhecer melhor o Proof fora do D12. É seu único álbum solo, infelizmente, uma vez que teve sua vida encurtada.

Como eu falei, Proof formou o D12 de mais formas que se imagina. Ele era a cola do grupo e resolvia todas as brigas internas dos membros. Sem Proof, o D12 morreu. Nunca um grupo foi tão dependente de um membro só – bom, o NWA não conseguiu muita coisa quando o Ice Cuba saiu fora. Proof resolvia brigas de Eminem com outros rappers. Ele sempre buscava reconciliação e paz. Então essa semana quando comecei a ver homenagens dos membros do D12 ao Proof, pensei que o melhor a fazer é celebrar a vida de Proof em vez de lamentar sua despedida. É o que Proof iria querer. Provavelmente, com seu senso de humor sujo, ele iria rir da nossa cara se visse a gente choramingando pelos cantos – assim eu gosto de pensar.

Sobre o autor

Ronald Rios é roteirista, comediante e documentarista. Apresentou o "Badalhoca MTV" de 2008 a 2011 na MTV Brasil. Na Band fazia o quadro "Documento da Semana" dentro do programa CQC, num formato de pequenos docs sobre pautas atuais na sociedade brasileira. Escreveu para o Yahoo, UOL, VICE, Estadão, Playboy, Red Bull e Billboard. Em 2016 fez a série de documentários "Histórias do Rap Nacional" para a TV Gazeta. Ronald também apresentou de 2010 a 2012 o programa "Oráculo" na Jovem Pan FM e foi roteirista do Multishow de 2009 a 2011, pela produtos 2 MLQS, onde rodou o programa de TV Brazilians, eleito um dos 5 melhores pilotos de TV nacionais de 2011 pelo Festival de Pitching de TV da operadora Oi. Em 2017 e 2018 rodou pequenos docs, podcasts e campanhas multimídia para o artista Emicida na gravadora Laboratório Fantasma.

Sobre o blog

Rap Cru é o blog do roteirista e documentarista Ronald Rios sobre Hip Hop. Brasileiro, americano, britânico, latino… o que tiver beats e rimas, DJs, grafiteiros e b-boys e b-girls, tem nossa presença lá.

Rap Cru